sábado, 22 de agosto de 2009

HOMEM AGORA PODE SER ESTUPRADO!!!

Excerto do grupo de Direito Penal, do prof. João tomas Lucsinger

O homem também como sujeito passivo do delito de estupro

(18.08.09)

Por Carlos Eduardo Rios do Amaral,
defensor público do Estado do Espírito Santo

Quebrando tradição secular de nosso Direito Penal, a Lei Ordinária Federal nº 12.015, de 07 de agosto de 2009, publicada no Diário Oficial da União do dia 10 do mesmo mês e ano, promoveu profunda e inédita alteração no art. 213 do Código Penal, e, de quebra, revogando
o art. 214 do mesmo diploma.

Eis as alterações:

Estupro

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. Pena - reclusão, de seis a dez anos.

§ 1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (quatorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.

§ 2º Se da conduta resulta morte:

Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

Para uma melhor compreensão da inovação legislativa trazida à baila, transcreve-se, também, a redação originária do dispositivo incriminador acima, que era vazada nestes termos seguintes:

Art. 213 - Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência
ou grave ameaça. Pena - reclusão, de seis a dez anos.

De um simples cotejo da redação dos dispositivos legais reproduzidos, a originária e a agora vigente, percebe-se, claramente, que a elementar do tipo do delito de estupro, que revelava seu sujeito passivo, “mulher” foi substituída pela expressão “alguém”.

Revela-se que, em vista disso, o sexo do ofendido será indiferente para a caracterização do crime de estupro. Que, agora, como visto, pode ser cometido tanto contra a mulher, como também contra o homem.

A própria revogação do art. 214 do Código Penal, deslocando parte de suas elementares para o delito do art. 213 desse mesmo diploma repressivo, qual seja, ato libidinoso, sob o mesmo e único nomem juris de estupro, não desafia qualquer dúvida.

Assim, a revogação do art. 214 não deixará ao desamparo jurídico-penal aquela vítima do cancelado delito de atentado violento ao pudor, que consistia no constrangimento violento à prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Uma vez que tanto a conjunção carnal não
consentida, assim como qualquer “outro ato libidinoso” forçado por meio da violência ou grave ameaça restaram tutelados em um único dispositivo penal, sem importar em hipótese de abolitio criminis.

O que, provavelmente, despertará grande dúvida na comunidade jurídica nacional, será a definição do que agora seja “conjunção carnal”. A expressão “outro ato libidinoso” prevista na parte final do novo art. 213, ao contrário do que se possa imaginar, não facilitará uma imediata solução para o impasse criado pela Lei nº 12.015/2009.

Se a expressão “conjunção carnal” fosse unicamente reveladora da cópula vaginal, ou seja, a introdução do pênis na cavidade vaginal da mulher, não seria necessária a outrora presença da elementar “mulher” na redação original do art. 213 do Código Penal.

É regra principiante em Direito que a lei não contém expressões inúteis. Se a tão-só introdução do pênis na cavidade vaginal da mulher, mediante violência ou grave ameaça, traduzisse a definição de conjunção carnal para a configuração do estupro, bastaria que o tipo do art. 213 enunciasse “constranger à conjunção carnal”, como, mutatis mutandi, faz o vigente Art. 123 do Código Penal, que tipifica o crime de Infanticídio (Art. 123 - Matar, sob a influência do estado
puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após), sem fazer menção ao sexo de seu sujeito ativo (agente), uma vez que só a mulher pode estar “sob a influência do estado puerperal”.

Poderá se argumentar que a elementar “mulher”, insculpida na redação originária do art. 213, consistiu em expressão baldada proposital, necessária para a consolidação do que seja conjunção carnal para o legislador de 1940, repudiando, assim, sua extensão ao coito anal. E que sua presença no atualíssimo art. 213, do modo como redigido, já possui sua definição precisa (conjunção carnal = cópula vaginal), descartando-se, hoje, a necessidade da complementação do núcleo “constranger” pela partícula “mulher”, evitando-se, por esse modo, a redundância de palavras.

Reservando-se cientificamente o coito anal para a elementar da prática de “outro ato libidinoso” disposta no final da nova redação do art. 213.

Estupro, assim, seria espécie de violação da dignidade sexual, tendo a conjunção carnal (cópula vaginal) e a prática de ato libidinoso diverso (coito anal) como suas sub-espcies. Preservando-se, assim, toda a dogmática penal do século passado, mas, em vista disto, tolerando agora a possibilidade da continuidade delitiva do art. 71 do Código Penal (crimes da mesma espécie).

Como se vê, a Lei nº 12.015/2009 trará profundas indagações ao seu intérprete. Mas, de toda sorte, extinto o delito de atentado violento ao pudor, deslocada sua expressão “ato libidinoso” para o novo art. 213 do Código Penal, tudo sob a mesma rubrica de “estupro”, concluímos
que, hoje, o homem também pode ser “estuprado”.

Revela-se, aí, ligeiro concurso formal, tratado no art. 70 do Código Penal, uma vez que teremos dois bens jurídicos violados, mediante uma só ação do agente, quais sejam, a liberdade sexual da pessoa e, também, a gramática da língua portuguesa.

(*) E.mail: edu.riosdoama...@gmail.com

fonte: http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=15740

comentário do professor:
a questão é interessante pois poderá resultar em abrandamento do
tratamento jurídico dado a tal tipo de delito, exatamente o contrário
do que pretendia o legislador. Vejamos:
- tradicionalmente sempre se considerou estupro o coito vagínico,
mesmo incompleto, ou seja, a penetração mas sem ejaculação.
- já o atentado violento ao pudor sempre se exigiu algum tipo de
contato físico e alguns julgados chegavam a considerar tal crime num
apalpar de seios ou nádegas, um aperto em coxas numa sessão de cinema,
uma "roçada" no transporte público, um beijo lascivo forçado, etc.
E agora?
Se equiparadas as figuras típicas, me parece lógico que algum tipo de
relevância na conduta deve ser considerado - algum tipo de efetiva
utilização da genitália, ficando para a contravenção penal da
importunação lasciva as outras figuras.

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