Texto escrito para o site Diário da Vida Jurídica
Publicado por Camila Arantes Sardinha - 1 dia atrás
O Advogado Criminal é constantemente rechaçado, mesmo dentre Advogados de outras áreas.
Hoje de manhã estava a comentar com uma colega de profissão sobre um pedido frustrado de Liberdade Provisória. Na mesma oportunidade, comentei que estava já a preparar o Habeas Corpus, e que estava inconformada com o indeferimento do meu pedido, diante de todas as provas que foram apresentadas.
Estava praticamente elaborando uma tese sobre a prática da prisão preventiva, e a falta de bom senso de alguns Magistrados, quando fui surpreendida por uma terceira pessoa, também colega de profissão, que sequer estava participando da conversa, dizendo: "Ah, vai dizer que o cara é um santo? Me poupe! Tá com dó, leva pra casa!".
Já perdi as contas de quantas vezes me perguntaram se eu tinha dó de bandido e por que não o levava para casa.
Sinceramente, nem costumo responder. Mas achei pertinente escrever sobre isso, já que me parecem jargões passados de geração em geração e que não geram nada além de ignorância e intolerância.
Para começar, vamos esclarecer uma coisa: ninguém defende bandido!Ninguém é a favor do bandido. O que se defende são os direitos de uma pessoa que está sendo processada criminalmente (lembrando que todo mundo é inocente até uma sentença condenatória transitada em julgado). O que se defende é o cumprimento da lei, de modo justo. E esse é o meu papel.
Quem nunca ouviu jargões como "bandido bom é bandido morto", "Direitos Humanos para humanos direitos", "Tá com dó? Leva pra casa!"?
Entretanto, juristas, conhecedores do Direito, deveriam extinguir esses jargões de seus vocabulários. E eu vou explicar o porquê.
Nós, advogados criminalistas, não estamos defendendo, em momento algum, o crime do cliente. É CLARO que não somos a favor de roubos, estupros, homicídios, latrocínios, furtos, estelionatos, etc. Todos nós desejamos uma sociedade justa, pacífica, e creio ser o sonho de qualquer pessoa poder sair na rua sem se preocupar em ser assaltado a qualquer momento, ou coisa pior. Viver sem ter que se preocupar em deixar os filhos sozinhos em casa, em não sair com a carteira na mão, ou agarrar a bolsa no metrô como se sua vida dependesse disso.
Todo mundo quer viver sem medo!
Entretanto, exterminar todos os criminosos é a solução para isso? Tratá-los como lixo é a solução para isso? Deixá-los apodrecer junto ao nosso tão precário sistema penitenciário é a solução para isso?
Se fosse, seríamos uma referência mundial de paz, haja vista o aumento substancial no número de encarceramentos nos últimos anos. Todavia, os dados da nossa criminalidade apontam o contrário.
Além de que muitas pessoas que se encontram atrás das grades não se enquadram naquele quadro de vilão que os jornais sensacionalistas tanto gostam de ilustrar. Muitas vezes são pessoas comuns (como eu e você) que acabaram se envolvendo em algum delito pelos motivos mais variados possíveis, mas circunstancialmente.
Algumas vezes são inocentes.
Fato é que nossa Constituição Pátria defende, acima de tudo, o direito à vida, como direito primordial, de mãos dadas com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Porque vida, meus caros, não é apenas subsistir, mas viver com dignidade. Todavia, cumpre salientar que nossa Constituição, em hipótese alguma, determina que esses direitos são apenas para alguns. Não há nenhum adendo que especifique que "aquele que tirou a vida de outro ser humano não tem direito às garantias fundamentais" ou "é vetada ao indivíduo condenado em sentença transitada em julgado a tutela das garantias fundamentais".
Sendo assim, o direito é para todos, inclusive para aqueles que nos causam repulsa.
Aliás, defender um cliente acusado de um crime repugnante não faz do advogado igualmente repugnante. A OAB/SP, em Nota Pública datada de 16 de fevereiro de 2012, alertou que:
"O advogado criminal não pode ser confundido com seu cliente; nem deve ser hostilizado pela sociedade, porque está no exercício da defesa de seu constituinte e cumprindo o que estabelece o art. 133 da Constituição Federal, tendo a seu lado a garantia da inviolabilidade de seus atos e de manifestações no exercício profissional".Fonte
Não obstante, estou acostumada a ouvir coisas como "queria ver você defender o bandido se ele assaltasse sua família".
Ora, é claro que se minha família fosse vítima de um crime, eu não poderia ser advogada do réu, já que estaria emocionalmente envolvida com o caso. Por isso mesmo o réu deveria ser representado por um advogado neutro, que pudesse realizar a defesa técnica sem influências externas.
Não é óbvio isso?
Além do mais, se eu tenho dó de bandido? Não, não tenho. Sou advogada criminal, sou fria, não me envolvo emocionalmente com meus clientes. Também não faço milagres. Se meu cliente cometeu um crime, vai responder por ele (não adianta prometer o contrário). Mas vai responder na medida de sua responsabilidade.
Mas sou legalista? Sim! E garantista também. Utopia? Talvez, mas no que me couber, faço valer a nossa Constituição e os direitos de quem quer que seja.
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AVISO IMPORTANTE
Este texto foi originalmente publicado no site Diário da Vida Jurídica, postado pela Dra Camila Sardinha. A reprodução parcial ou total deste é autorizada somente mediante a manutenção dos créditos e a citação da fonte original(link aqui). Grata
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